domingo, 15 de julho de 2012

Passo Fundo, 15 de julho de 2012


A carta de despedida.


Não poderia usar nada mais do que palavras para me expressar.  Poderia me expressar pintando um quadro, ou construindo uma casa. Mas vou usar do que me conforta para te contar algumas coisas. Essa não é mais uma carta de amor, é sim, uma carta de despedida. A noite que passou tive um sonho estranho, acordei pensativa e me dei conta que deveria realmente por para fora o que senti por você. Verdades. 



Um café não suportaria tantas palavras diluídas. Café com sal, café com açúcar.

  1. No meu sonho eu observava um homem que empalha animais, e ao dessecar a peça ficava ali, tomada de cuidado para nao estragar a "moldura". Quantas palavras escondidas entrelinhas para guardar segredos. Não poderia ser diferente. 


O que passamos juntas nesses 10 meses serviu para que aprendesse a viver melhor. 

Cada momento juntas parecia que era o primeiro e o ultimo.  Parecia que o antes e o futuro não existiam. Nunca nos demos de nos preocupar com o passado. Eu dei tanta importância para coisas pequenas, coisas que acabaram por nos atrapalhar no meio do caminho, e parecia que você iluminava cada passo do meu caminho. 

Penso que nunca fomos suficiente uma para a outra. Como uma dose de veneno que tomávamos todos os dias para nos fortificar.  Fomos intensas, tão rápidas, não chegamos a caminhar, pois pelo que sei, pessoas "normais" caminham, fizemos tudo diferente de tudo. Afinal eramos diferente do resto da parcela humana. E com tanta rapidez, tudo era muito rápido, as nossas qualidades nos acentuavam ao máximo,  e nossos defeitos nos engoliam cada vez mais. Voávamos. 

De cigarros em cigarros misturados com cervejas na sacada da tua casa nos conhecíamos, nos amávamos, nos descobríamos coisas magníficas uma da outra e nos questionávamos mais e mais.

Brincávamos de amantes, éramos namoradas, descobríamos e aflorávamos a nossa maturidade que não passava de um passo a frente da nossa infância e um regresso a ela.  

Amar para mim nunca foi algo fácil como você sempre soube, as ideologias iam se disseminando os meus dogmas me seguravam mais e mais. Você era a fonte de tudo, e a saída de tudo.  Você quebrava e desmistificava todos eles. Era dolorido ao mesmo era bonito. Em cada abraço, eu do lado direito e você do esquerdo da cama era uma coisa única.

Nós fomos como Dali e Lorca, tão estranhas um para outra como tão conhecidas, como íntimas. Tudo foi uma grande montanha russa, pois nós achávamos que nos conhecíamos, e no fim aprendíamos que  no fundo era pouco aquilo que esperávamos uma da outra.

Imaturidade a minha, rapidez sua, pressão do resto do mundo, não sei.  O que sei é que era tudo aquilo que eu precisava. O quadro estava sendo pintado lentamente, como Picasso em seu cubismo, ou talvez a loucura de Dali. A nossa pintura era tão imperfeita que era linda, causa diversas impressões externas. E tenho absolutamente certeza que essa estranheza do externo acarretou para ele não ser finalizado, ser pintado até o fim.

Nessa escola, eu aprendia, subia um degrau e  tu me acompanhava, era lindo, magnífico. Só com você eu me senti mulher, mulher de corpo, alma e coração. Nunca percebera a minha mudança? Eu estava apreendendo coisas que a vida nunca antes tivera me dado, e só um elefante de pernas de aranha para não errar, para não escorregar na tinta.  Meus melhores dias floridos de inverno eram aqueles, mas de repente tudo mudou, a cachoeira secou, os galhos secaram, e neve caiu. Naquela noite, fria, que chorava e murmurava na cama eu senti como se um milhão de larvas escorregavam pelo meu estômago e queimavam todas as borboletas que ali nasciam. Em cada palavra que ecoava na minha cabeça era como se fossem uma tortura mental e as lagrimas que custavam a cair eram como gelo cortando os olhos. 

Desde então preferi o caminho mais fácil, fugir, assim como os morcegos fogem da luz, fui para outros caminhos, encontrei  cordeiros e no fim eram lobos. Todos tinham até então o gosto da tua carne,  os olhos que engoliam  e o sorriso de chapeleiro maluco que me amaldiçoava. Enquanto isso, tu continuava a sua jornada ao mesmo tempo em que corria atrás, corria a frente.E quando parou foi como uma mordaça que fere os olhos e os ouvidos e que finge não ver e não sentir. No fim e no sim, sei que não é começo o sim e um não. 

Essa noite fui então de encontro para o quadro e vi que a pintura não estava completa, abri o armário e encontrei as tintas, e senti vontade de pintar novamente, a única coisa que falta é aquilo que até então ajudou a pintar aquela magnífica obra de arte, porém vista por outros como duvidosa, mas vista por dentro como perfeição. O quadro estende a mão e pede que o volte a colorir, tenho o pincel, mas não tenho mais as tintas. 


Hoje eu me despeço de você, de nós e de uma vida que um dia foi colorida.



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